O Ministério Público do Rio Grande do Norte (MP-RN) abriu uma das maiores investigações recentes envolvendo o setor de apostas esportivas ilegais no estado. Segundo o órgão, ao menos 24 plataformas de apostas (“bets”) atuavam ou ainda atuam ilegalmente, operando com base em uma suposta regulamentação municipal editada pela Prefeitura de Bodó — um pequeno município de aproximadamente 2.300 habitantes que, de forma surpreendente, tornou-se polo de “legalização” dessas empresas.
Movimentação milionária em menos de um ano
Entre novembro de 2024 e setembro de 2025, o MP-RN identificou uma movimentação financeira expressiva: cerca de R$ 415 milhões passaram pelas plataformas que se beneficiaram da regulamentação municipal. O cálculo decorre do próprio sistema de arrecadação adotado pelo Município, que cobrava das empresas um repasse de 2% da receita bruta. Somente esse repasse resultou em R$ 8,3 milhões aos cofres municipais no período — valor absolutamente incompatível com a realidade econômica local e que, por si só, já levantou fortes indícios de irregularidades.
Crimes investigados
A investigação conduzida pelo Laboratório de Tecnologia contra Lavagem de Dinheiro do MP-RN apura cinco práticas ilícitas, entre crimes e contravenções penais:
- Lavagem de dinheiro;
- Induzimento à especulação;
- Exploração de jogo de azar e loteria não autorizada;
- Associação criminosa;
- Crime contra as relações de consumo.
A amplitude das condutas investigadas demonstra que o suposto sistema de “regulamentação” local tinha potencial para operar como uma fachada para o funcionamento de casas de apostas ilegais em larga escala — aproveitando-se da ausência de controle estatal adequado e da aparência de legalidade criada pelo município.
Bloqueio judicial milionário
Nesta semana, a Justiça potiguar deferiu o bloqueio e sequestro de bens no valor de R$ 145 milhões pertencentes aos investigados. Entre os bens atingidos estão contas bancárias, aplicações financeiras, investimentos em previdência privada, veículos, imóveis e outros ativos.
De acordo com o promotor Augusto Lima, coordenador do laboratório do MP-RN responsável pelo caso, o montante bloqueado corresponde ao “valor aferido de movimentação fraudulenta” identificada pelo órgão durante as apurações preliminares.
Um caso que expõe fragilidades na regulação das apostas
O episódio de Bodó levanta questionamentos relevantes sobre a atuação de pequenos municípios na tentativa de regular atividades complexas e altamente sensíveis, como o setor de apostas — que exige controle rigoroso, transparência e mecanismos robustos de compliance.
A investigação segue em andamento, mas o caso já se destaca como um marco na atuação fiscalizatória do Ministério Público potiguar, sinalizando que irregularidades no setor das apostas não passarão despercebidas, independentemente do porte do município envolvido.


